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Poesia brasileira atual
By Davi Andrade Posted in Brasil, Literatura, Poesia on 9 de Agosto, 2025 517 words
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1.

Teu corpo,
o que é
senão o que paira
sob os imensos ocasos
que,
hora a
hora,
desabam
sem perceberes?
A cada ano,
tornando-te
ainda mais cansado…
A cada ano,
tua breve vida
anunciando
ainda mais breve,
ainda mais próxima,
a partida…
Mas levantas como um apóstolo do caos,
embora não tenhas fé
nem nada próximo a isto…
Levantas,
comes o que os dias oferecem
e, com um irresistível sono,
assistes aos avanços e retrocessos
a que os homens chegaram
em nossos dias…
Mas não desejas melhoras…
É verdade:
te dói que há gente com fome,
que há gente que morra de maneiras distintas,
que,
em Gaza,
neste momento,
mil tempestades de estrelas convertem as crianças,
as igrejas,
as escolas,
em uma flor de ossos feridos…
Mas,
ante tudo isso,
o teu drama (ir)real e
(tão mesquinho)
é estares
(ou te sentires)
sozinho…
É não atentarem
a ti,
( à tua
poesia…)

*-*-*

2.

Cheiro de fruta morta
O tempo cai sobre a tarde
Silêncio sob o som das cigarras

*-*-*

3.

Nas ruas,
o esquecimento…
Em cada rosto-sonho,
um mar de despedidas…
Um dia,
ainda,
essa ausência-infinda
crescerá,
descerá,
devorará o mundo…
Enquanto isso,
ensaio as articulações
–da queda…–
as configurações
–da morte…–
–O poema…–

23/mar/25

*-*-*

4.

E descemos pelas encostas
pela urgência das sedes
pelas noites.
Os mares escapavam
dos teus olhos-turmalinas…
E foram incontáveis gritos antes que o vazio se fizesse…
E foram impossíveis assombros
antes que o Silêncio—
espanto—
escombros—
fulgores ondeantes de desejos—
transbordasse…
Os tempos cindidos como o ósculo dos relógios
sobre a terra ferida
sobre as águas perdidas…
De tudo nos jorrava um sangue
um sangue negro e espesso
um breu que
de repente—
Céu…—
Que
de repente—
Vida…—
Que
de repente—
Nada…—
Que ecoava
tudo aquilo—
o que desconheço… —

*-*-*

5.

Vai sempre comigo o vazio em que me guardaste às sombras,
com todo o sonho impossível e imperfeito…
Vai sempre comigo uma urdidura no peito,
de frias manhãs como esta agora…

E, se te sonhar é tal
como lembrar o sonho perdido,
serei sempre o meu passado,
sempre o escasso de um futuro delido,
de um descanso adiado e esquecido…

Mas, na manhã duma saudade tão fria como a que sinto agora,
em que a chuva me traz os ventos-verdadeiros dum desejo-memória,
dizendo-me que tudo passa,
e, como a água,
sem que o esperemos,
vem o tempo e despedaça os relógios

Só rogo a Deus
não seja logo esse fim…
Só clamo à chuva
que se demore sobre mim ainda e sem pressa…

pois uma dor tão doce e calma
é de amor que nos inunda…
é de vida que nos cerca…

*-*-*-*-*

Davi Andrade (26 anos) é natural de Maceió (AL) e licenciando em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Conheceu a poesia em 2017, quando começou a escrever poesia. Já teve dois poemas publicados na edição de 2024 da Revista luminescências, organizada por estudantes da Faculdade Alagoana de Letras (Fale). Entre seus poetas favoritos estão Milton Rosendo, Fernando Pessoa, Ivo Machado, Jorge de Lima, João Cabral de Melo Neto e Florbela Espanca

*-*-*-*-*


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