REPTO
tente-me
porque é azul demais e
ofego
rasgue-me
porque os pássaros sabem e
itinero
afine-me
porque é louco o gosto e
aparvalho
ria-me
porque é a luz que abre e
retino
brilhe-me
porque a boca é nunca e
retumbo
finja-me
porque o sangue exala e
rumoro
cuspa-me
porque a noite é presto e
sincopo
nunque-me
porque o resto é sina e
bem-quero
***
FIO DA MEADA
na antiquíssima casa nova
o lago é oferta de destino
e impulsos
segredo: a miniatura vem
impregnada de sedes insípidas
e espinhos
o desejo do lago subsiste
embora as placas proíbam
espia-se pela fresta (roçar de dedos)
por onde o ensejo é
a própria paisagem impossível
nunca o horizonte em que se desliza
a carne girando em busca do dourado
a dúvida é o que mais nos aproxima e
nos afasta da vida
é o peixe mortíssimo e apodrescente
a celebração das moscas
o que nos mira?
será tudo um susto e apagar-se as luzes
é só o artifício útil no emaranhado
o corpo velho ainda conjuga olhos
temeria verter infinitos
por medo do verdor da água
e sua espada
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Luci Collin, nascida em 1964 em Curitiba (PR), é ficcionista, poeta, educadora
e tradutora curitibana. Tem 24 livros publicados entre os quais Querer
falar (Finalista do Prêmio Oceanos 2015), A palavra algo (Prêmio Jabuti,
poesia, 2017), Rosa que está (Finalista do Prêmio Jabuti poesia, 2020), Dedos
impermitidos (contos, 2021, Prêmio Clarice Lispector – Biblioteca Nacional) e
Olho reavido (poesia, 2022). Participou de diversas antologias nacionais e
internacionais (nos EUA, Alemanha, França, Bélgica, Uruguai, Argentina, Peru
e México). Na USP concluiu o Doutorado e dois estágios pós-doutorais em
Estudos Linguísticos e Literários em Inglês. Ocupa a Cadeira 32 na Academia
Paranaense de Letras.