…. e Moisés subiu à montanha, a nuvem cobriu a montanha e envolveu-o
durante seis dias. Ao sétimo, e sempre no meio da nuvem o Senhor
chamou a Moisés; depois entrou na nuvem e subiu à montanha e ali
permaneceu durante quarenta dias e quarenta noites.
Aqui, tempo natural, sonhamos a nuvem da fresca passagem. Navegamos na
estrela lunar, nossa nuvem não é lar, é vento, níveo álamo, mar, e Juno passa-lhe à frente para com ela
dançar.
E a nuvem noivando vai acompanhando as longas noites de amor.
De nada serve à viagem causa alheia ao navegar – causa de ser em outros
prisão e sofrimento – pois nada serve ao ser cativo cantar o próprio tempo. Liberdade que aguarda
ainda a dureza do cimento.
Mas tu que sabes, procuras- constróis- sabeis que para além das sepulturas
ainda vamos estar os dois. Levando a nuvem que vai, trazendo a terra que vem, sabendo da mão incerta
do silêncio que a mantém.
E dos ares chegam agora gases estranhos, rectas riscam os céus, e a nuvem do
Senhor já não é macia nem se evolam mais os filhos seus. Mais tarde trará a chuva, e o deserto fica em
flor, os olhos miragem de lágrimas, lembrar-se-ão então deste estranho amor.
Se subirdes vezes várias a condição não se perde, subir e descer as escadas
que a montanha é crescer… Passar a nuvem e andar, saber do nevoeiro e do mar, e deles ficar lavado da
terra densa, suada. Depois partir as estátuas, quebrar as tábuas, e não vacilar, que as vozes se fazem
altas para a grande Nuvem Solar
***
É preciso ser flor é preciso ser ave
Preciso é ser amor e trocar os pés pelo ar.
Mas é preciso andar, cuidar do jardim, sabendo beijar as Horas.
É preciso estar por dentro, e mais preciso estar por fora.
Tudo necessário, mesmo abrasar.
É preciso que se cheire, é preciso o perfume.
Para parares no meu lume.
É preciso atravessar o tempo todo e ele não bastar.
Cuidar de dar a quem deu, e quem nos devolveu todas as faces do amor.
É preciso ir depressa e sem parar, que a vida não espera, e não nos faz retornar.
***
ALGORITMO
E agora que o tempo nos transformou, a natureza antiga pode passar despercebida.
Somos o requiem, dilatado coro de proscritos, e já assassinámos nossos gritos.
Ficámos sentados a ver o tempo chegar, lento prosseguir…
Exemplarmente os nossos assentos são formas de morrer , selado, o tempo de viver .
Quase não temos nome, nomeamos as vozes mas não sabemos quem são.
Este interregno é um local sem rota.
Agora é luz gritante a maravilha, e se o amor bastasse o nosso nome o ergueria.
Mas não bastou. Estávamos protegidos pelas forças da terra, hoje a alma acorda
A superfície é larga, está longe e quase nos afoga. Quase Inverno que pensamos ser Verão.
E as gentes carregam suas vidas agarradas a si como únicas, e a dimensão partida segue a
Viagem da imensidão.- A vida de cada um , não quero escutá-la! –
Para ela, a ilusão de pensar que a têm, fechada como os tesouros, pois que a morte é muita
No Ano das nossas vidas múltiplas.
Nós submeteremos as vitórias aos rigores, e se não os sentirmos, nem por isso paramos de tentar.
Lentos os movimentos das coisas… enquanto o evento seguir estamos expectantes, por vezes
choramos, e seguem-se desistências, mas não para as lembrar.
Tínhamos mais sentidos que quando percorridos nos levavam ao céu, e de tão sonhados ainda cantava
em nós querubins de um deus. Tudo esvaziado, e deste lado não fazemos mais que dizer adeus. Aos
que estão, aos que partem, aos que não estão e se debatem.
E reinos outros, outras Nações, andavam em brandas asas quase esquecidos da folhagem, que ardeu, foi
ardendo, e o ar que respiramos talvez esteja envenenado, e no corpo doendo o que pensamos ser
efeito, são as voltas de uma alquimia votada ao realejo.
Cidades escureceram quando as florestas em brasa falaram essa dor- os dias da escuridão- bíblicos são,
porque vêm lembrar os actos das nossas mãos. E mesmo assim, insistimos que eram os animais e
outros hospedeiros, que de tão próximos não extinguem o lume feito pelas fornalhas que deixamos
acesas.
Explicamos os males com males menores, e mesmo assim eles poderiam ter sido bem maiores. Não há
já lobos no povoado, mas vimos entrar nas cidades os animais calados que a nossa segurança consentiu.
Entraram sem pedir licença, e o que é certo é que tudo pareceu de repente mais bonito, presenças
livres em forma de mito.
Fizemos isso a nós mesmos, atirámos para fora os que não eram da cidade desejados, coisas que nos
avisavam da tormenta da exclusão, retendo perto todos aqueles que utilizávamos para o interesse da
nação. Mas as pragas não se calam, nem a vida consente mais sofreguidão. Avançamos cambaleantes
para os antídotos, talvez outras coisas aconteçam, e sejamos nós a formar os nossos guetos.
Imponderáveis são todos os sinais, mas não os sentir chegando, é mais, muito mais do que esperávamos
ter visto. Dar a volta ao mundo parece mais fácil do que imagináramos, e talvez ele já seja pequeno
para os males propagados.
Devemos esquecer a treva e voltarmo-nos para os trevos, sabendo que tudo acontece em linha de
montagem para a resposta rápida que se tornou em percepção um pouco mais pequena. Encontramo-
nos aqui, parados, mas valorizando o movimento.
Que seja de vento a velocidade do arranque e nele tenhamos sentidos que caminhem protegidos das
mortes de antes. Um ciclo se fechou como reposteiros rasgados , assaltos empilhados , derrotas
devolvidas. Sobreviventes fomos às nossas próprias armadilhas!
Conseguimos no entanto ver no todo o tudo que as coisas são. Ligados estamos, e nos ligamentos
começamos a nascer de dia para o dia, que a noite serenou. Menos atrito, menos detrito, menos
coragem? Talvez. Já não somos abundância e quebrámos a imagem.
Tudo vem de mais longe, de um ponto não esperado, e se esperar é agora um sinal, que seja largo.
Reduzir as inércias devoradoras, ampliar mais caminhos, que o futuro brilha como um astro e já não é
sozinho.
Cumpra cada um sua missão, que a vida não baloiça como as bolsas, mas pode abrir fissuras com
abismos de extrema largura que vão engolindo as brumas e os que aqui estão.
Tudo o que é novo virá como um ladrão na noite.
Única solução.